sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Nos olhos,
a luz que faz o dia:
luz direta, firme,
que cega.

Na escuridão dos olhos,
manchas caleidoscópicas,
distribuições do firmamento:
brilhos circulares alongam-se
e cristais cintilam.

Diluições cambiantes.

Na face imóvel, apenas o vento,
frescor vindo de seguidos morros,
onde retilínea estrada foi ondulada,
ao romper-se a caatinga verdejante.

Quando os olhos estavam abertos,
a estrada aparecia e desaparecia,
um veículo veloz cobria-se de sol
e despertava tapetes de borboletas.

Ah!.. Foi enquanto flores tinham mil cores
e fecundavam a luz que fez o dia,
exalando mil odores de mel
em busca da direção do mundo.

domingo, 27 de novembro de 2011

Ela e seus ouros envelhecidos
e seus brinquedos violados,
ela perfeitamente.

Roupas apagadas no silêncio,
cabelo caídos – desalinhos
e sóis negados na metade do dia.

Nas sombras construídas,
opacidades de espelhos, imagens,
chãos exauridos.

Nos seios esmagados,
há uma criança deixada
e vultos elaborados.

Tudo se esconde nas desistências,
nas aparências das lágrimas,
nos contrários dos sentidos.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

A poeira é necessária.
Há valimentos, considerações
e pessoas consentidas,
as sobras.

Ela se estende no ar
e define a imobilidade.
Depois, expande-se
e assenta-se no chão.

A poeira é só um elo frio,
a correção e o envolvimento,
o laço invisível,
a correlação familiar.

É o que fica da repetição dos rostos,
costumes de sombras aprisionadas
(e no cansaço, com as intimidades,
as vontades modificadas).

A chuva sempre é perfeita ao amanhecer.

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Na inteireza da noite, derreamentos.
E risos, algazarras, pessoas que passam
sob uma janela, em uma rua, no vazio.
O silêncio é lunar.

Na penumbra, a mesa com uma jarra,
flores escurecidas...
E ninguém tirou a cadeira do lugar:
o medo, o assalto, a descoberta.

Palavras são deixadas nos dias,
desnecessárias.
Os olhos são vagos e solúveis,
inconsistências inúteis.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Quando me incorporo escuridão,
sou como aquela imagem,
de líquidos e membranas orgânicas,
com meus olhos que não mais me enganam.

Feto azul, violeta ou lilás, tão cintilante,
tão sem contrários e tão sem sonhos,
sou ordem em espelho negro e mágico.

E faço-me minha própria metade atroz,
porque não tem idade, nem nascer,
nem um único instante.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

O lado de dentro,
onde estão pessoas antigas
e os ausentes.

Luzes pálidas esticam-se fracas e nuas sobre todos,
luzes de silêncios fixados, lâmpadas de teto.

Conversas fúteis, palavras desnecessárias.
Bocas alongam-se e retraem-se: vozes,
contornos de lábios e hálitos inúteis,
há noites retidas nas palavras.

Olhos desbotados, acostumados,
eles se trocam nas mesmas faces,
novas costuras em roupas antigas,
as lâmpadas estão bem fixas.

E moscas dormitam, sempre dormitam...
Nos fios que prendem as lâmpadas, na quietude.
E sólido e conciliado o lado de dentro.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Quase não se vê a poeira,
o que permanece, a ordem,
princípio e fim....

Ela sempre cai lentamente
sempre única, leniente,
na sala das imagens presumidas.

Há um saber e um quarto recusado,
o valor de um relógio de parede
e um desconhecido significado da rua.

Tudo é discreto...
Até as desestabilizações do ar aprisionado.

[Sala de visitas]

sábado, 2 de julho de 2011

Sempre o instante administrado,
o não-acontecer:
adequações.

Na fria lama de terra e sangue,
répteis deslizam sem voz.

Vestidos com ventos,
esqueletos e almas detidas,
equilíbrios, articulações.

Tudo se supõe resolvido
(nas latências, nos segredos lacrados),
há simetrias, ar e luzes coniventes.

E tem-se a propriedade, a casa,
e o alimento é o tempo conservado.
No teto, o vértice da carne adormecida.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

[Cotidiano]

A porta:
receio dos olhos que se compõem,
círculos que se fecham nos significados
e nos tempos abjurados, desconcebidos...
Na sala, dispõem-se os objetos.

E alguém está sempre a chegar,
há lamúrias casuais e pouco interesse,
o que se tem no ar, na velha poeira habitual,
os ordinários das palavras, os comedimentos.

Um cigarro consome-se, vozes,
sonos validados e objetos nominados,
a fumaça alarga-se e expande-se na luz,
formas dissolvem-se...

Os aspectos resolvem-se nos olhos acostumados
E a conversa divaga, modula-se pertinente,
a poeira flutua e desordena-se ordenada,
sempre leniente e pousante...

Na porta definitiva, articula-se o que deve ser,
o que não se transpõe.

A porta é muito concludente,
é confusão de sonhos interrompidos.

[Sala de visitas]

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

A SALA

Percebe-se a sala da noite.
Ela está depois da varanda,
logo após a porta fechada,
quando cerradas as janelas.

Na sala, luz comum às sombras,
velhas mobílias, pessoas assentadas,
sentinelas e olhos afastados,
preferências e um ritmo vulgar,
o pretenso e a intimidade acostumada,
o que se dispõe, o sintomático.

Do lado de fora, os acoites do vento,
os pesos universais.

[Sala de visitas]

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

ANUNCIAÇÃO

Aconteço em mim mesmo,
movimento-me,
criatura ou não-criatura.

Formas e conteúdos conjugam-se,
há pressa,
um tempo em construção.

[Sala de visitas]