sexta-feira, 29 de maio de 2009

SURGIR

O que acontece é desordenado:
o indiferenciado, a disformidade,
o não-significado.

Pelos filtros óticos,
a luz tênue e indistinta
é o dia de lá de fora,
o que constrói o ambiente.

Conteúdos em sucessivas formas,
as causas do tocar e do tocar-se.

Há uma razão ignorada,
o inato dos olhos cintilantes,
as variações dos pesos,
dos tumultos da noite inteira.

No plasmar dos sonhos,
a vontade de gritar
e a leveza do ar...

terça-feira, 26 de maio de 2009

REMATES

Afogar-me no mar.
O relógio flutua protegido.
São vários ventos, várias ondas,
e existe um dia sintético.

...

Há a permanência e o silêncio,
uma pesada carapuça atribuída,
um tempo sólido de relógio,
um suspiro mudo, um grito imundo.

Tudo se encerra no dia,
no cérebro que explode,
na modalidade de um mar,
morre-se de veias e sangue.

E existem os artifícios de uma avenida,
o abismo que ela veste para o mar,
tudo que contém um tempo morto,
uma voz e uma inutilidade para os ventos.

Adiante, a ilha distante.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

ALIENAMENTO

Entre minhas pernas, vômitos e pus...
E sai meu cérebro inteiro,
sai minha presença.

Em minha boca, uma enorme e incômoda dor,
meus olhos não existem, nunca existirão:
tenho as indiferenças das imagens,
o sem-sentido.

De meus ouvidos podem surgir infâmias,
a destruição do tudo e do nada,
uma avenida plástica,
a renitência dos dias.

terça-feira, 12 de maio de 2009

SUCUMBÊNCIA

Os gritos foram eternos...
Intestinos expostos e almas diluídas,
mãos que se levantaram vencidas,
cicatrizes extremas nos olhos resolvidos.

Sob as túnicas que cobriam os rostos,
as fisionomias contorciam-se,
corpos sugavam a si próprios,
nuvens anoitecidas cobriam os céus.

Restaram as dores inconclusas,
os vultos descompassados e intensos ,
os dias seguintes, os muitos dias...

sexta-feira, 8 de maio de 2009

QUANDO ELA PASSA

Seus olhos verdes...
Eles escondem ternura, carinhos,
e escondem-se de mim.
Ah, como sinto o passar dos dias,
em seus olhos tão verdes,
que me levam e fogem!

Dentro de mim, moça,
dou-lhe imagens que não existem
e, nas intensidades de meus sonhos,
invento-lhe a suavidade da brisa,
um suposto corpo matutino
e orvalhos anoitecidos.

Por trás do céu,
estrelas brilham escondidas.

OFERENDA

Beba este sangue que lhe ofereço
e também coma esta carne!...
Tudo! Beba e coma...
Tudo inteiramente!
É o que lhe ofereço.


E muito ria deste momento!
Faça-o em nossa ruína, em nossa desgraça,
na lama que tanto nos é afirmada quando repudiada,
e considere as condições, as origens,
os favores que nos fizeram!

domingo, 3 de maio de 2009

NO CAVALO ROUBADO

Vamos logo, agora mesmo, maravilhoso cavalo!
Leve-me agarrado em seu corpo de pêlo castanho,
na liberdade de suas crinas ao vento!

Já, no bater da cancela deste curral,
com meus pés-menino apertados em seus vazios,
para longe dos tijolos e dos sentidos das casas...

Há um bueiro que desafia o céu,
o barulho das maquinarias,
o forte cheiro do caxixe,
os canaviais invasores dos olhos,
das colinas mundo,
o calor do açúcar quente.

Leve-me para longe, bem longe!
Para bem depois do mandiocal,
do cemitério dos nativos esquecidos,
para a imensa mata do dia apagado,
para as grutas das onças adormecidas
e os rastros das cobras noturnas...

Leve-me onde está a santa-cruz do preto sofrido,
entre as árvores que os homens não abraçam,
onde estão os negros cavalos-do-cão
e as arapuás que se misturam aos cabelos,
fecham os ouvidos, fecham as narinas
e cegam os olhos!

Leve-me para onde estão as cigarras da tarde,
eternas em seus gritos tão distantes e solitários,
mas não me deixe esquecer o que já existe!